segunda-feira, 4 de maio de 2009
O caminho mais curto para fracasso voltar
Das muitas reflexões acerca do colapso do sistema neoliberal, três despontam com claridade. A primeira é a de que, para salvar o Titanic afundando, não bastam correções e regulações no sistema em naufrágio. Precisa-se de outra rota que evite o choque com o iceberg: uma produção que não se reja só pela ganância nem por um consumo ilimitado e excludente. A segunda e a de que não valem rupturas bruscas na ilusão de que já nos transportariam para outro mundo possível, pois seguramente implicariam no colapso total do sistema de convivência, com vítimas sem conta, sem a certeza de que das ruínas nasceria uma nova ordem melhor. A terceira é a de que a categoria sustentabilidade é axial em qualquer intento de solução. Isso significa que o desenvolvimento necessário para a manutenção da vida humana e para a preservação da vitalidade da Terra não pode seguir as pautas do crescimento até agora vigentes (olho no PAC de Dilma Rouseff). Ele é demasiado depredador do capital natural e parco em solidariedade generacional presente e futura. Importa encontrar um sutil equilíbrio entre a capacidade de suporte e regeneração da Terra com seus diferentes ecossistemas e o pretendido desenvolvimento necessário para assegurar o bem viver humano e a continuidade do projeto planetário em curso que representa a nova e irreversível fase da história.
Esta diligência precisa acolher a estratégia da transição do paradigma atual que não garante um futuro sustentável para um novo paradigma a ser construído pela cooperação intercultural que signifique um novo acerto entre economia e ecologia na perspectiva da manutenção da vida na Terra.
Onde vejo o grande gargalo? É na questão ecológica. Ela é citada apenas en passant nas agendas políticas visando superação da crise. Na reunião do G-20, no dia 2 de Abril, em Londres, o tema não influiu na formulação dos instrumentos para ordenar o caos sistêmico. Não se trata apenas do mais grave de todos: o aquecimento global, mas também do degelo, da acidez dos oceanos, da crescente desertificação, do desflorestamento de grandes zonas tropicais e do surgimento do planeta-favela em razão da urbanização selvagem e do desemprego estrutural. E mais ainda: a revelação dos dados que mostram a insustentabilidade geral da própria Terra, cujo consumo humano ultrapassou em 30% sua capacidade de reposição.
Uma natureza devastada e um tecido social mundial dilacerado pela fome e pela exclusão anulam as condições para a reprodução do projeto do capital dentro de um novo ciclo. Tudo indica que os limites da Terra são os limites terminais deste sistema que imperou por vários séculos. O caminho mais curto para o fracasso de todas as iniciativas visando sair da crise sistêmica é esta desconsideração do fator ecológico. Ele não é uma “externalidade” que se pode tolerar por ser inevitável. Ou lhe conferimos centralidade em qualquer solução possível ou então teremos que aceitar o eventual colapso da espécie humana. A bomba ecológica é mais perigosa que todas as bombas letais já construídas e armazenadas.
Desta vez teremos que ser coletivamente humildes e escutar o que a própria natureza, aos gritos, nos está pedindo: renunciar à agressão que o modelo de produção e consumo implica. Não somos deuses nem donos da Terra, mas suas criaturas e seus inquilinos. Belamente termina Rose Marie Muraro seu livro “Querendo ser Deus, por quê?” (a sair em breve pela Editora Vozes) “Quando tivermos desistido de ser deuses, poderemos ser plenamente humanos o que ainda não sabemos o que é, mas que já intuíamos desde sempre”.
Fonte: Leonardo Boff / Ambientalista, Escritor e Teólogo
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